sábado, 21 de maio de 2016

Varejo quer mais algodão ecológico, e Nordeste desponta

O Ciclo do Algodão desempenhou importantíssimo papel no desenvolvimento econômico do Estado do Ceará até que veio a praga do bicudo e acabou com tudo. Em 1992, no entanto, um teimoso grupo de pequenos produtores rurais decidiu investir novamente na cultura de uma outra forma, uma aventura chamada, à época, de "algodão ecológico". A ideia surgiu no Estado do Ceará, fomentada pela Organização Não Governamental Centro de Pesquisa e Assessoria (Esplar), incluindo os municípios de Quixadá e Quixeramobim, no Sertão Central; e Tauá, no Sertão dos Inhamuns. Depois vieram ações pontuais nos Estados da Paraíba e em Pernambuco. Em 2005 as ações foram intensificadas com a identificação de empresas interessadas na produção.

Atualmente cerca de 1.200 agricultores familiares do sertão do Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte produzem um algodão que, aos poucos, vem conquistando um mercado cada vez maior de exigentes consumidores que querem não apenas vestir ou calçar, mas fazer disso um hábito transformador num planeta que exige atitude diante dos desafios da convivência saudável da espécie humana com o seu meio.

A má notícia - sem contar com a escassez de chuvas que tem atrapalhado muito a produção dos últimos anos, determinando uma falta de constância na produção, a ser sanada com a ampliação da produção em diferentes pontos da região - é que a falta de estrutura, inclusive para comunicar esse potencial ao mundo, mantém a produção inferior a 0,1% do algodão consumido no País, enquanto a produção do Planeta mal atinge 1% do uso global.

Mas o melhor são as boas notícias. Há um mercado crescente interessado não apenas na produção nordestina, mas em incentivá-la. Começou com francesa Veja. Agora outros mercados se mostram interessados, entre eles, a Catalunha e a Alemanha. As informações são do pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Algodão, Fábio Aquino de Albuquerque, um dos participantes da mesa de debates, realizada nesta semana, no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo, no pré-lançamento do documentário "For the Love of Fashion" - "Por Amor à Moda".

Documentário

Apresentado por Alexandra Custeau, neta do célebre Jacques Custeau, conhecida por defender a importância da conservação e da gestão sustentável da água para manter o Planeta saudável, produzido em conjunto pela National Geographic e a C&A. A estreia no Brasil está agendada para o próximo dia 25, às 17h15, no canal.

O documentário, que apresenta ao mundo a simplicidade e o alcance a produção do algodão orgânico na Índia e a virada da rede de lojas C&A, mostra o potencial desse mercado e que produzir de forma sustentável pode não ser nenhum "bicho de sete cabeças". O lançamento, realizado em conjunto pelo Instituto C&A e pela National Geographic, faz parte também de uma grande campanha da Companhia para levar aos seus clientes o conceito de que vestir pode ser uma atitude muito mais abrangente no sentido de tornar o Planeta mais habitável hoje e no futuro.

O presidente da C&A Brasil, Paulo Correa, destaca que atualmente 10% do que vende já é produzido com algodão BCI (Better Control Initiative), ou seja, aquele que tenta resolver o impacto negativo da cadeia produtiva, num processo de melhoria contínua, cuidando do solo, com uso racional da água, relações justas de trabalho, iniciado pela Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), em 2003, segundo Andrea Aragon, consultora de agronegócios, que também participou dos debates.

Indagado sobre a possibilidade de consumir o algodão orgânico do Nordeste, Correa foi categórico ao anunciar que tem todo o interesse. Já são quatro tecelagens e 12 fornecedores no País, com tendência de crescimento. Mas, infelizmente, esbarra na limitação da escala. "Se nós comprássemos toda a produção deles hoje, não daria para alimentar nem uma semana da nossa necessidade", afirmou. A meta da C&A é ousada: Ainda neste ano quer alcançar 15% das peças com algodão BCI, mas, até 2020, pretende chegar a 100%.

"Nós acreditamos que o poder da informação e a união de várias pessoas em prol de uma causa são a chave inicial para a mudança", afirmou o diretor global de Sustentabilidade da C&A, Jeffrey Hogue, que também participou a mesa pós-apresentação do documentário. Para ele, essa atitude tem tudo a ver com os 175 anos da empresa, que está em sua sexta geração da família, preservando valores muito fortes. Jeffrey reconhece que a realidade do documentário está desconectada do Brasil, mas acredita que, se conseguir comunicar bem, essa vontade vai surgir. E ainda revelou a disposição de ajuda aos produtores para se atingir essa meta dos 100%.

Para o pesquisador da Esalq, Lucílio Alves, outro a participar do debate, o caminho da sustentabilidade não tem mais retorno, mas o grande desafio é lidar com as externalidades, principalmente a comunicação com os consumidores e a dinâmica produtiva.

Multinacional de origem holandesa fundada em 1841 pelos irmãos Clemens e August, a C&A está presente no Brasil desde 1976, onde possui 280 lojas, com a meta de oferecer produtos e informação de moda de forma acessível. Desde 2006, audita a cadeia produtiva, monitorando padrões de negócios socialmente responsáveis. Em 2010 foi a primeira do setor a assinar o Pacto Nacional pelam Erradicação do Trabalho Escravo.

Momento difícil

No Estado do Ceará, o diretor do Esplar, Pedro Jorge Ferreira Lima, explica que o quadro climático contribuiu muito para a desarticulação dos cotonicultores familiares.

"O número dos que conseguem colher é menor a cada ano", destaca. No Ceará, esses pequenos agricultores estão nos municípios de Choró, Quixadá, Quixeramobim e Canindé, no Sertão Central; e também em Tauá, Independência, Nova Russas e Monsenhor Tabosa, no Sertão dos Inhamuns.

A produção é vendida para a francesa Veja, que lançou a marca no Brasil com o nome de Vert (verde em Francês), e pela Justa Trama. Mas Pedro Jorge reconhece que há outros mercados interessados e atribui a incapacidade de ampliar a produção à falta de assistência técnica. "Se o governo ajudar, há como atender a outros mercados", diz. Ele citou o caso de um produtor de redes de Jaguaruana, que tem importado algodão da Turquia para atender o cliente alemão e até se mostrou interessado em produzir sementes para estimular a produção local.

E é disso que o governo está precisando para ajudar. O coordenador de Agricultura Familiar da Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA), Itamar Lemos, disse que abriu edital para a compra de sementes de algodão orgânico para o Programa Hora de Plantar, mas não apareceu ninguém. "A semente que circula mais é a transgênica. Se houver um produtor de orgânica, será um grande incentivo", disse.

Mais informações:

Estreia no Brasil do documentário For the Love of Fashion

Data: 25

Horário: 17h15

Canal: National Geographic

Fonte: Diário do Nordeste

Nenhum comentário:

Postar um comentário