Em meio a uma das maiores crises
hídricas já enfrentadas no Estado, a dessalinização da água não apenas tem sido
eficaz no abastecimento humano, quanto foi o socorro providencial para matar a
sede do rebanho. Como exemplo dessa realidade, há a experiência pioneira do
Programa Água Doce (PAD), na comunidade de Jurema, no distrito de Aroeira, a
28Km da sede de Pentecoste, que atende cerca de 30 famílias.
O
PAD já conta com 188 dessalinizadores funcionando e com mais 122 em
implantação. A iniciativa foi concebida para 222 localidades, identificadas não
apenas pela dificuldade de oferta dos recursos hídricos, mas também por reunir
os mais baixos indicadores de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), buscando
atender, prioritariamente, as populações de baixa renda residentes em
localidades rurais do Semiárido. O Programa é uma ação do Governo Federal,
coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), em parceria com diversas
instituições federais, estaduais, municipais e sociedade civil. No Ceará, está
vinculada à Secretaria de Recursos Hídricos (SRH).
Inovações
A
ideia, apesar de já ter sido tentada no passado, ganhou no presente inovações.
Como se vê na Comunidade da Jurema, são os moradores que operam o equipamento,
além de que as lideranças locais se comprometem com os serviços de manutenção
do equipamento. No entanto, o que se faz com o rejeito da água depois que se
torna doce para beber é o que há de mais importante: a escória não é mais
jogada aleatoriamente em terrenos abertos, mas levada a tanques, que passam a
ter uso difuso, como transferir água para cochos de animais, utilização em
irrigação de plantas que servem como forragem animal e até para a criação de
peixes.
Na Jurema, toda a cadeia de ações planejadas vem
sendo executada há 11 meses. A presidente da Associação dos Moradores da
Comunidade Matias, Maria Helena Honório Pires, conta que o programa chegou em
boa hora, pois o rigor da seca ameaçava a sobrevivência dos moradores do lugar.
"Nós lutamos por esse chão. Agora, não tinha como ficar sem os animais e
água para beber", destaca.
Quase tudo conspira para o
abandono do lugar. Até chegar a Jurema, são mais de 18Km de estrada carroçal. O
sol do meio-dia e a ausência da arborização fazem com que os habitantes não
saiam às ruas. No entanto, a água que se encontra no cocho do rejeito recebe um
rebanho sedento. Os usuários se comprimem para beber um produto que passou a
contar com outras demandas, como as aves nativas, as seriemas e os pássaros,
além dos animais domésticos.
Outros
beneficiados
Maria Helena conta que a água é
servida também para moradores de comunidades adjacentes, tais como Muquém e
Irapuá. Há cobrança pela oferta hídrica. Um garrafão de 20 litros custa R$ 1,00.
O dinheiro é destinado para a ajuda de custo do operador e para alguns serviços
de manutenção requeridos pelo equipamento.
O operador
Ivonildo Barbosa Marques, conta que, por duas vezes, o equipamento apresentou
defeitos. Contudo, a preocupação maior é com o decréscimo da vazão do poço, que
caiu de 3 mil litros por para 2.200. Ele disse que o ideal seria a perfuração
de um novo poço profundo, em vista de que as demandas deverão aumentar até a
chegada da estação chuvosa.
Eficiência
O
coordenador do PAD no Ceará, Ricardo Marques, disse que o sucesso da iniciativa
decorre de fatores que reuniram o baixo custo com a eficiência. Com o
dessalinizador, fabricado em Russas, no Vale do Jaguaribe, foi possível ter um
equipamento mais barato. O custo é em torno de R$ 60 mil, enquanto que para
construir o prédio, implantar os tanques e outros implementos a unidade acaba
com um valor aproximado de R$ 105 mil, pagos pelo governo federal com
contrapartida de 10% do Estado.
"A proposta do Água
Doce era fazer diferente do que já se fez com os dessalizadores no passado.
Esses eram entregues às comunidades e ficavam abandonados porque não tinham
como manter", conta Ricardo. A diferença passou a ser bem maior do que
delegar aos moradores do lugar a responsabilidade de operar e manter os
aparelhos e até mesmo as edificações onde são comportados. "Atualmente,
somente instalamos nos locais que já contam com poços perfurados, há uma
demanda crítica de recursos hídricos e que incluam os moradores com as mais
baixas rendas", disse o coordenador do programa.
O Água
Doce conta com uma rede de cerca de duzentas instituições, incluindo os Estados
do Semiárido e parceiros federais. Em cada um desses Estados foram
estabelecidos, por Decreto Estadual, uma Coordenação e um Núcleo Estadual de
Gestão do Programa Água Doce, este último composto por representantes do poder
público e da sociedade civil envolvidos no tema de oferta de água. Em 2011 o
Programa passou a compor o conjunto de ações do Plano Brasil sem Miséria, um
esforço do Governo Federal no combate à pobreza extrema que visa reduzir as
desigualdades sociais e promover melhorias na qualidade de vida dos
brasileiros.
Histórico
No
Ceará, os esforços em torno de incorporar o Água Doce nas Ações de combate aos
efeitos da seca tiveram início em 2009. Naquele ano, o Ministério do Meio
Ambiente, por meio da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, firmou
convênio com a Secretaria dos Recursos Hídricos do Ceará (SRH), sendo que as
primeiras experiências no Estado se deram por meio da implantação de duas
unidades demonstrativas, que foram os Assentamento Mundo Novo, em Russas; e
Comunidade Calumbi, em Tauá.
No ano de 2012, foi firmado
Convênio com o Governo do Estado do Ceará, por meio da SRH no valor total de R$
36.295.483,89 objetivando a recuperação e instalação de 222 sistemas simples de
dessalinização em comunidades do Semiárido cearense distribuídas em 45
municípios. Para tanto, foram diagnosticadas 666 comunidades em 48 municípios
cearenses. Após execução de testes de bombeamento e análise físico-química da
água do poço de 444 comunidades, foram selecionadas as 222 comunidades a serem
beneficiadas.
Para o coordenador do programa no Ceará,
Ricardo Marques, é uma ação que desponta para além da expansão nas áreas onde
há água salobra no subsolo e imprestável para o consumo humano. Mais do que
isso, conforme ele, as estratégias do programa para redução dos impactos
ambientais e sustentabilidade dos dessalinizadores integram a ação trabalhos de
mobilização social e sustentabilidade ambiental, oferecendo capacitação para
construção dos acordos de gestão pelos moradores das comunidades atendidas e a
correta utilização dos sistemas, entre outros.
Fonte:
Diário do Nordeste